Escrito por: Gabriella Braga
Lei Maria da Penha, criada para prevenir a violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar, completa 16 anos em 2022. Legislação foi avanço no combate à violência de gênero
Em 2021, o Disque 190 recebeu, a cada minuto, uma ligação denunciando casos de violência doméstica. No mesmo ano, uma mulher foi vítima de feminicídio a cada 7 horas, e a cada 10 minutos uma mulher foi estuprada. Os dados são do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).
Considerada referência mundial no combate à violência doméstica e familiar, a Lei Maria da Penha (11.340/60) completou 16 anos no mês de agosto - o mês destinado à conscientização pelo fim da violência contra a mulher.
A legislação, criada para prevenir este tipo de violência, dar assistência às vítimas e punir seus agressores, foi nomeada em homenagem à Maria da Penha, mulher que lutou por vinte anos para conseguir a condenação do marido após ficar com graves sequelas decorrentes de duas tentativas de assassinato.
A partir da Lei Maria da Penha, a violência contra a mulher no âmbito doméstico passou a ser tipificada em cinco formas: física, sexual, psicológica, moral e patrimonial. Um dos mecanismos da legislação é justamente proibir que o agressor se aproxime da vítima, através da medida protetiva. A ação garante que, muitas vezes, os casos de violência não evoluam para algo mais grave, como o feminicídio.
Entre 2020 e 2021, o número de medidas protetivas de urgência concedidas aumentou em 14,4%. Foram 370.209 apenas em 2021, contra 323.570 em 2020, segundo o FBSP. No mesmo período, houve aumento de 3,3% nos casos de ameaça, chegando a 597.623 notificações. Já os casos de feminicídio chegaram a 1.341 no ano passado.
O período coincide com o isolamento causado pela pandemia do coronavírus, quando as mulheres ficaram ainda mais vulneráveis à violência doméstica, já que tiveram que permanecer trancadas em suas residências, muitas vezes, com seu próprio agressor, além de encontrarem maiores dificuldades em procurar rede e canais de apoio e acolhimento.
O relatório Visível e Invisível: A Vitimização de Mulheres no Brasil, produzido pelo FBSP e Instituto DataFolha, aponta que uma a cada quatro mulheres brasileiras com idade acima de 16 anos foi vítima de algum tipo de violência no primeiro ano da pandemia, em 2020. Isso significa que cerca de 17 milhões de mulheres sofreram violência física, psicológica ou sexual no ano.
Deste total, 4,3 milhões foram agredidas fisicamente com tapas, socos ou chutes, e cerca de 13 milhões foram vítimas de ofensas verbais, como insultos e xingamentos. Ameaças de violência física atingiram 5,9 milhões de mulheres e outras 2,1 milhões foram ameaçadas com faca ou arma de fogo. Além destas, cerca de 3,7 milhões sofreram ofensas sexuais ou tentativas de estupro.
Namorados, maridos, ex-companheiros ou familiares. Este é o perfil dos principais autores de violência contra a mulher: 72,8% dos acusados são conhecidos das vítimas. Não somente no ambiente doméstico e familiar, mas também no trabalho, nas ruas, nas escolas, em quaisquer espaços, a mulher ainda não se encontra plenamente segura e protegida.
Mesmo com os avanços na legislação no combate à violência contra a mulher, a cultura do pensamento machista e patriarcal em nossa sociedade, que ainda prevê às mulheres o seu papel social enquanto cuidadora do lar e dos filhos, impõe drasticamente a continuidade da desigualdade e discriminação de gênero.
As dificuldades em denunciar os casos de violência também são vivenciadas pelas vítimas. Vergonha, medo, culpabilização, falta de rede de apoio, dependência emocional, são vários os fatores que impedem as mulheres de procurarem ajuda, seja ela dos órgãos de segurança pública ou ainda de familiares e amigos.
Muitas vezes, as vítimas também não se percebem em um ciclo de violência. Enquanto que a agressão física é evidente e mais reconhecida, a violência psicológica, moral e patrimonial ainda são pouco identificadas pelas próprias mulheres e por aqueles ao seu redor. Desta forma, os agressores conseguem manter a manipulação sobre as vítimas, sem qualquer punição perante a Justiça.
Desta forma, debater o tema em todos os espaços, especialmente no ambiente educacional, impondo conteúdos relacionados à prevenção deste tipo de violência, além de abordar os aspectos que reforçam o machismo na sociedade, deve ser prioridade ao se falar na conscientização e combate à violência contra a mulher.
É preciso ainda ensinar as mulheres a identificar as várias situações de violência e reforçar a necessidade de se denunciar estas agressões - seja ela física, psicológica, sexual, ou outras - pelos canais oficiais, através do Disque 190, da Polícia Militar, ou do Disque 180, canal especializado em denúncias de violações contra as mulheres, que conta com rede de amparo e acolhimento às vítimas.
O machismo mata todo dia, mas as vozes das mulheres estão unidas em um só coro: basta de violência!